O governador Beto Richa (PSDB) anunciou ontem uma auditoria nas contas da
Polícia Civil e a reorganização de toda a estrutura administrativa da
corporação. Em síntese, trata-se de uma intervenção, já que a auditagem do fundo
rotativo e o novo desenho organizacional da instituição ficarão a cargo de uma
empresa privada a ser contratada por meio de licitação. Ao mesmo tempo, o
governador prometeu rigor nas investigações das irregularidades apresentadas
pela série de reportagens iniciada no domingo pela Gazeta do Povo. A Assembleia
Legislativa, o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado também vão
investigar as denúncias (leia mais nesta página).
O secretário estadual de Segurança Pública, Reinaldo de Almeida César,
detalhou que o objetivo é que a empresa terceirizada “repense” o “desenho
organizacional”, os procedimentos e atos de gestão da Polícia Civil. Ao mesmo
tempo, a contratada deve fazer uma auditoria nas contas da corporação,
principalmente no fundo rotativo. A Gazeta do Povo mostrou casos de delegacias
fantasmas que continuam recebendo recursos do fundo. Segundo o governador, o
edital de licitação para a contratação da empresa que fará o planejamento será
publicado nas próximas semanas. Nas palavras do governador, a Polícia Civil vai
passar por “uma reestruturação administrativa completa”.
A princípio, não haverá substituições de delegados que comandam a Polícia
Civil, mas as mudanças também podem chegar ao comando da corporação. “Todos,
desde o mais simples servidor que possa ter tido uma participação nessa questão
do fundo rotativo até o mais graduado delegado de polícia, ninguém vai escapar
dessa investigação”, assegurou Richa. “Se houver necessidade de trocar cargos,
seja em qual estrutura for, é evidente que isso acontecerá. Tão ou mais
importante que a mudança de pessoas é a mudança de estrutura, mudança de
procedimentos, é quebra de paradigmas”, complementou o secretário.
Para Almeida César, as denúncias apresentadas pela reportagem revelam um
“caos” na segurança pública, alicerçado não só na estrutura organizacional da
Polícia Civil, mas também na falta de investimento e no sucateamento das forças
policiais do Paraná. “Tudo que foi publicado só reforça o que sentimos desde o
primeiro dia: que há um profundo desmantelo da segurança pública. Municípios sem
policiais, viaturas paradas, necessidade de se recompor as estruturas
administrativas”, definiu.
Falhas históricas
O governador e o secretário atestaram que as suspeitas de irregularidades no
fundo rotativo da Polícia Civil são um problema histórico. Há pelo menos15 anos
já haviam sido identificados indícios de falhas nos repasses de recursos às
delegacias do interior do estado. Entretanto, não foram divulgados detalhes dos
casos. “Desde 1996 existe registro na Secretaria de Segurança de que existe
reclamação, existe o próprio secretário da época apontando irregularidades na
gestão desse fundo rotativo em várias regiões do estado”, apontou Richa.
O levantamento feito pela Gazeta do Povo considerou o período entre 2004 e
2011, intervalo sobre o qual há dados disponíveis no portal da Transparência do
governo do estado. Uma equipe de jornalistas identificou valores excessivos para
municípios pequenos e foi a campo para comprovar que o dinheiro saía das contas
da Polícia Civil e não chegava ao destino, muitas vezes porque nem delegacia
existia na cidade.
MP e TCE vão apurar os indícios de fraude
O Ministério Público do Paraná (MP-PR) e o Tribunal de Contas do Estado (TCE)
vão investigar as denúncias publicadas na série de reportagens “Polícia Fora da
Lei”, iniciada domingo pela Gazeta do Povo. O MP abrirá uma investigação na
Promotoria de Proteção ao Patrimônio Público no âmbito cível e criminal. Já o
TCE tomou três medidas para comprovar as irregularidades e melhorar a
fiscalização nas contas do fundo rotativo da Polícia Civil.
De acordo com o presidente do TCE, conselheiro Fernando Guimarães, o
tribunal abrirá procedimentos de responsabilização. Caso se comprovem as
irregularidades, os delegados gestores do fundo poderão ter de devolver o
dinheiro recebido. Além disso, Guimarães já determinou a realização de estudo
para desenvolver a melhor forma de fiscalizar o dinheiro do fundo. Hoje, a
prestação de contas dessa verba está inclusa nas contas da Secretaria de Estado
da Segurança Pública (Sesp).
“A lei estabelece que esse fundo seja repassado para a delegacia. Essas
pessoas que receberam o recurso retornam a prestação de contas para a
secretaria. E a consolidação dessa prestação é encaminhada ao TC pela prestação
anual da Sesp”, explica Guimarães. Pela proposta do conselheiro, a prestação de
contas do fundo deve ser analisada de forma específica e não dentro das contas
da secretaria.
Guimarães admite que as contas do fundo rotativo passaram pelo TCE sem que os
auditores fossem checar o destino final dos recursos, nas delegacias. “No geral
das contas da Sesp, o porcentual do fundo rotativo, não que seja irrelevante,
mas é pequeno em relação às outras despesas. E, como temos dificuldades de
recursos humanos e materiais, os inspetores não selecionaram como foco o fundo
rotativo das delegacias”, justifica.
No entanto, ele diz não ter havido falha do TCE. “Houve uma priorização de
outros aspectos. Por critério de relevância, não tivemos condições de estar em
todas as pontas da execução desta especialidade (o fundo). O ideal é que
estivéssemos em todos os lugares, mas é impossível.” A 5ª Inspetoria de Controle
Externo do TCE, responsável pela análise das contas da Sesp, também ficou
encarregada de iniciar uma investigação a partir do que foi apurado pela
reportagem da Gazeta do Povo.
Para Guimarães, é preciso construir um sistema financeiro mais moderno,
aliado a um bom controle interno. “Eu posso ver a dificuldade deles (da Sesp e
da Polícia Civil). É conjuntural. É um problema de controle interno. Agora,
depois de anos, é que o estado está implantando um sistema”.
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